Sobre final de ano, família, comparação e recomeços

Imagem: Freepik.

Estão chegando as festas de final de ano e com elas as reuniões em família que geram muitas perguntas: e os namoradinhos? Já passou no vestibular? Esse curso não dá dinheiro, não é melhor fazer outro? Seu primo entrou em engenharia/medicina/curso fora do Brasil e está rico.

A lista de frases de efeito e perguntas invasivas é imensa e pode gerar muita comparação com outras pessoas, sobre os relacionamentos que elas têm, o carro ou a casa que compraram ou o curso que fazem que é mais valorizado socialmente.

Sempre achamos que estamos atrás, pois a sociedade coloca uma lista certinha de que você tem que se formar no Ensino Médio com 17 e já ir para a faculdade, formar-se aos 22 ou 23, já engatar um intercâmbio, fazer outras viagens pelo Brasil, ter um relacionamento legal e já estar casando antes dos 30. É quase como se fôssemos robôs.

Eu entendo que nem sempre nossa realidade financeira nos permite cumprir essa lista da mesma forma que outros com mais recursos. E as redes sociais estão aí para gerar ainda mais comparação. Podemos ver pessoas que antes mesmo dos 18 já têm feitos que parecem muito distantes da nossa realidade.

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É nas festas de final de ano que justamente partes da família com realidades bem diferentes se encontram e as pessoas não medem comentários, principalmente se o objetivo for exaltar seus filhos ou parentes mais próximos, mesmo que isso seja de forma até mesmo inconveniente.

Embora eu não seja tão mais velha que os vestibulandos (tenho 28 anos enquanto escrevo), gostaria de dividir um pouco do meu aprendizado até aqui e também alguns conselhos que meu eu adolescente de 15 a 18 anos queria ter ouvido.

1. Família, cobranças e seguir o próprio caminho

Como profissional da educação que atualmente trabalha com atendimentos, vejo crianças, adolescentes e adultos diariamente. Quero esclarecer que nem sempre a família sabe o que é melhor, mesmo que eles aconselhem com muito boa vontade.

Há famílias que não vêem valor no estudo, acham errado um jovem estar sentado estudando e preferem que ele esteja fazendo tarefas domésticas ou favores a eles. Porque o estudo demora anos para trazer resultado e as pessoas são imediatistas e acham que precisam preencher todo o tempo dos filhos, ou eles irão fazer coisas erradas.

Por vezes, vejo famílias que até incentivam estudo, mas se for em medicina, direito ou engenharia. Para eles, somente essas áreas dão dinheiro e o resto a pessoa vai passar fome.

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É bom lembrar que a vida é realmente cara em nosso país e eu não estou romantizando isso, mas preciso dizer também que como professora consigo morar sozinha e me sustentar e não passo fome, como alguns gostam de dizer (sei que quem tem filho já é outra história, com muito mais gastos).

Vejo que no nosso país os filhos não têm espaço para desenvolver sua autonomia. Por vezes, não podem escolher uma roupa que gostam (o que os vizinhos vão pensar? Veste o que eu mandei!), não podem ter um hobby que não seja lucrativo (desenho? Uma língua que não seja inglês? Skate, surf ou capoeira não são esportes de gente decente), não podem sequer questionar quando seus cuidadores gritam, xingam ou humilham (quem manda aqui sou eu! Quem come do meu pirão come do meu cinturão).

Eu não sou mãe, mas acredito que o que é inaceitável com uma mulher, idoso ou animal não pode ser aceitável com uma criança ou adolescente. Não adianta querer adultos cheios de iniciativa ou opinião se as pessoas foram silenciadas durante toda sua infância e adolescência.

Vejo que muitos de nós só podem ter o próprio estilo ou mesmo fazer as coisas que gostam quando moram sozinhos. Isso acaba sendo perigoso para os jovens, já que podem se distanciar dos pais e ficar mais próximos de amigos que, às vezes, mostram-se influências negativas.

2. Comparação

Nossa, eu lembro como era ruim ser comparada com pessoas que tinham toda uma estrutura financeira, emocional, apoio dos pais e acesso a escolas e cursos elitizados.

Era uma comparação injusta e me sentia incompetente, mas com o passar dos anos e observando a desigualdade em nosso país, vi que somente esforço não é o bastante. Eu precisava ter acesso às oportunidades e esse acesso por vezes demanda dinheiro.

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Esse foi um dos motivos que me motivou a estudar para concursos, porque a vida no interior não é fácil, por vezes falta médico, falta exames que você tem que fazer na capital a 100 km de distância, por vezes até mesmo cursos de línguas, esportes, lazer, um cinema, um museu, um parque, nada disso está ao nosso alcance.

Não tinha como fazer uma comparação com algum primo que mora num apartamento em bairro nobre da cidade, estuda em escola cara, tem empregada doméstica em casa (não gastando tempo com atividades domésticas) e ganha carro aos 18 anos.

Seria legal ter tudo isso? Claro, mas quando não temos, sabemos que precisamos trabalhar muito para superar o déficit na aprendizagem para fazer o Enem, trabalhar para pagar passagem de ônibus e xérox, assim como aluguel por morar em outra cidade.

Não vejo como um discurso vitimista reconhecer todas as diferenças sociais. Podemos conquistar as coisas com esforço? Claro. Mas como alguém que veio do interior, tenho que dizer que, na corrida da vida, quem tem melhores condições financeiras larga na frente.

3. Final de ano e recomeços

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Quando chega o final de ano, alguns de nós tendem a ficar mais reflexivos e fazer comparações da nossa família com a dos outros, do nosso trabalho, se estamos desempregados então, a autoestima vai lá no chão, de relacionamento, depois cobram filhos, enfim, nunca será o suficiente.

Cada pessoa pode seguir seu caminho e buscar novas formas de alcançar seus objetivos. Todo dia podemos fazer outras escolhas ou escolher continuar no objetivo.

Se você não passou no vestibular esse ano, tente de novo ano que vem e busque metas diárias, fique menos tempo em rede social, não faça comparação entre sua realidade e a de outra pessoa, isso só gera mais ansiedade.

Se eu puder dar outra dica, movimente-se, faça uma caminhada, vôlei, natação ou o que estiver disponível em sua região. Atividade física ajuda a diminuir a ansiedade, ajuda a melhorar o sono e dá mais disposição nas atividades diárias.

Um Feliz Natal a todos e que o ano de 2023 venha com muita saúde e também seja de muito esforço para alcançar suas metas, mas não se esqueça de fazer coisas que te façam feliz durante o processo.  

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